domingo, 13 de maio de 2012

Correia da Fonseca: Empobrecer, dizem


Tenho me esforçado para acompanhar os debates em torno da atual crise do capitalismo, bem como as consequências das medidas que os países, em especial, europeus vêm tomando. Reproduzo a seguir texto do jornalista e escritor português, Correia da Fonseca, onde com justa ironia nos relata um destes debates. Confiram:

Quando o pensamento económico dominante se exprime com franqueza é compreensível: por exemplo quando confirma que a alternativa a um desenvolvimento económico baseado na defesa do interesse nacional – que nada lhe interessa – só pode ser, no actual quadro, o do empobrecimento generalizado. Para que sejam preservados os privilégios e a riqueza de meia-dúzia.

Foi num dos muitos debates que atafulham os tempos de antena dos canais ditos informativos. Falava-se então do pequenino escândalo político consubstanciado na declaração que Vasco Lourenço lera em nome da Associação 25 de Abril, reforçado pela ausência dos “capitães” e também de Mário Soares na sessão solene havida na Assembleia da República. Como de costume, as opiniões dividiam-se, embora não muito radicalmente, o que também não é raro. E foi nesse quadro que Miguel Sousa Tavares, para sublinhar a legitimidade do actual governo independentemente do acordo que as políticas por ele adoptadas possam ou não merecer, lembrou que ele surgiu na sequência de eleições democráticas e livres: “– A democracia é isto!”, disse. Entendia-se, é claro: o povo votara em liberdade e dos resultados eleitorais haviam resultado uma maioria parlamentar e um governo, este. Miguel ter-se-á esquecido de que Hitler foi eleito assim. Um bom exemplo. Para reflectir.

Um pouco paralelamente, sucedeu que num outro debate acontecido em qualquer dos tais canais, com a economia, as finanças e a crise como temas, alguém evocou com nostalgia os tempos em que a independência financeira de um país, concretizada no facto de possuir moeda própria, permitia a manobra financeira de desvalorização da moeda. Entre as consequências dessa medida avultava o facto de as importações se tornarem mais difíceis, porque mais caras, e as exportações um pouco mais fáceis, porque mais baratas para o país que as recebesse e pagasse. O resultado positivo do conjunto desses dois efeitos sobre as balanças comercial e de pagamentos é óbvio, não é preciso explicitá-lo, e percebe-se que seja uma pena que, tendo abdicado de moeda própria e do direito de estabelecer barreiras aduaneiras, Portugal esteja impedido de usar essas defesas. Mas já então uma outra voz se levantava no contexto do debate e explicava que, na falta dessas armas perdidas, era preciso adoptar uma outra. Essa de nome assustador: empobrecer.

Entende-se. Se o País está mais pobre, maneira de dizer que está mais pobre a generalidade das gentes que o habitam, a coisa resulta nas duas consequências acima apontadas. Por um lado, os seus habitantes empobrecidos vão deixar de poder adquirir bens vindos do estrangeiro, o que reduz o valor global das importações com efeitos benéficos na balança de pagamentos. Por outro lado, se a pobreza for consequência da redução ao mínimo dos salários pagos pelos produtores nacionais, o custo da mão-de-obra assim reduzido permite que as empresas exportadoras coloquem os seus produtos nos mercados externos com preços mais baixos, o que, podendo intensificar as exportações, ajuda a redução dos défices comerciais e de pagamentos. De tudo isto resulta que a pobreza, que desde tempos imemoriais já era considerada muito conveniente para a salvação das almas, pois bem se sabe que o sofrimento facilita a entrada no Paraíso, passa a ser também recomendada como panaceia para as violentas maleitas económico-financeiras que açoitam o nosso quotidiano.

Tudo bem, pois: já que não temos moeda para desvalorizar, empobreçamos. Mas quem deve empobrecer? Os participantes no debate televisivo não o explicitaram, mas talvez se sentissem dispensados de o fazer porque a resposta à pergunta está diariamente a ser dada perante os nossos olhos: quem deve pagar esse peculiar preço do empobrecimento são os que já são pobres (porque, enfim, já estão habituados, é só questão de sofrerem um pouco mais) ou os que já estão muito perto da pobreza cuja vinda há muito pressentem (e, portanto, não terão o sofrimento da surpresa). Quanto aos que, felizmente, estão bem instalados na vida, é claro que não se pode pedir-lhes que empobreçam. Em primeiro lugar, porque seria para eles um grande choque. Em segundo lugar, porque o País precisa de se mantenham por aí grandes ou mesmo médias fortunas. Para o investimento. Nas bolsas, é claro, não em actividades produtivas que dão muito trabalho e são arriscadas. Em terceiro lugar porque eles não deixam, e por isso sempre providenciam para que haja “ordem nas ruas e nos espíritos”. Para que a pobreza venha, se avolume, inche como os ventres das crianças esfomeadas. E, dizem, salve o País. Isto é: os salve.

sábado, 12 de maio de 2012

Eduardo Bomfim: Um mundo melhor

Reproduzo artigo do Camarada Eduardo Bomfim:

Durante o século XX muitos das gerações que sucederam umas às outras tinham como pressuposto ético de vida pensar o mundo para melhor. Uns lutavam por transformações econômicas, sociais, radicais, outros desejavam reformá-lo, vários pensavam que ele já estava de boa medida, tratava-se apenas de ajustá-lo no que fosse possível.

Em uma visão simplista poderíamos definir essas tendências como revolucionárias, reformistas ou conservadoras, apesar do surgimento de fenômenos como o nazi-fascismo, durante os anos vinte aos quarenta, subproduto dos conflitos pela hegemonia capitalista-imperialista, ensejando a Segunda Guerra Mundial.

Mas no geral os confrontos políticos, filosóficos, ideológicos, teológicos, giravam sempre sobre a questão: como poderia ser esse mundo menos injusto, qual a maneira para aperfeiçoá-lo ou transformá-lo ?

No final do século vinte, com a débâcle do campo socialista ocidental, especialmente a URSS e o leste da Europa, pari passu ao movimento de centralização, concentração do capital financeiro mundial em escala mais agressiva, acontece uma inflexão profunda na geopolítica, na economia, nos conceitos gerais das sociedades como decorrência desse processo.

Pensadores marxistas definiram esse período da História surgido ao final do século como um "tempo inicial de sombras e trevas" que transcendia o aspecto da luta pela emancipação dos trabalhadores, estendia-se ao conjunto da atividade humana em todos os seus aspectos.

A vida mostrou que se tinha razão, nasce o pensamento único hegemônico imposto à base de um paradoxo, uma sociedade totalitária governada sob regras discricionárias, combinada com um individualismo sem fronteiras como princípio e fim da vida moral.

Entroniza-se assim outro conceito para as gerações, já não se trata de construir um mundo melhor como espírito ético da civilização, mas como, nessa ânsia hedonista infinita, o indivíduo realiza o melhor dos mundos para si próprio.

E se há novas vocações políticas, então que elas se realizem através de uma agenda social global unificada, pré-definida, nos marcos do sistema.

Mas as contradições estruturais do capital reaparecem em meio à brutal crise demonstrando a face totalitária, a exaustão econômica, um enorme cansaço social à ordem e à ideologia "globalizada", indicando que a alternativa a esse modelo de sociedade é mesmo a luta por um mundo melhor.

* Advogado, Presidente do PCdoB em Alagoas e membro do Comitê Central.
terça-feira, 8 de maio de 2012

Aquecimento global: as previsões furadas de Lovelock


A ideia do Aquecimento Global parece que não é mais tão conveniente como antes, será mais um dos efeitos da crise do capitalismo? Bom, recomendo esse ótimo artigo do camarada José Carlos Ruy:
e a Terra não esquentou...

Por José Carlos Ruy 

James Lovelock é um dos gurus da tese segundo a qual o aquecimento global, provocado pelo homem, vai esturricar a Terra. Agora, diz que estava errado. Um erro de consequências políticas monumentais.

James Lovelock é um dos principais ideólogos do catastrofismo ambiental em nossos dias e um dos gurus do movimento ambientalista. Autor de inúmeros livros, formulador da hipótese Gaia, que vê a Terra como se fosse um enorme organismo, ele é um cientista influente que chegou a prever a morte de bilhões de pessoas devido às mudanças climáticas que, em sua opinião, iriam esturricar o planeta. Foi um dos formuladores da tese de que a mudança climática decorre da ação humana sobre o ambiente. 

Ele chegou a propor, em 2004, que o que restasse da humanidade só conseguiria viver no Ártico, onde o clima continuaria “tolerável”. E pregava, na linha do mais radical ambientalismo, a necessidade de um “melhor uso dos recursos” da Terra e isto significava, desde as reuniões do Clube de Roma, em 1968, e da ONU em Estocolmo, 1972, a contenção do desenvolvimento da economia. Isto é, contenção do desenvolvimento econômico dos países pobres, para, usando palavras de Lovelock, “sustentar a civilização o máximo de tempo” possível. A palavra “civilização” esconde, nesta frase, aquilo que realmente seu autor quer dizer: os países ricos e o modo de produção capitalista. 

Lovelock é, assim, um dos principais – se não o principal – defensores da tese de que o aquecimento global decorre da ação humana. Na verdade, era. Numa entrevista ao site da rede norte-americana MSNBC, em 23 de abril passado, o cientista britânico, de 92 anos de idade, renegou o catastrofismo climático e ambiental e admitiu que exagerou. Reconheceu, sem rodeios: "Tudo bem, cometi um erro."

Naquela entrevista ele disse que o comportamento do clima da Terra desde o ano 2000 contrariou suas previsões mais pessimistas; admitiu que os estudos a respeito são insuficientes, faltando mais pesquisas para entender o futuro do planeta. Reconheceu ter ido “longe demais na extrapolação” sobre o aquecimento global, quando deveria ter sido mais cauteloso. "O problema é que não sabemos como o clima atua, embora achássemos que sabíamos 20 anos atrás. Isso levou à publicação de livros alarmistas, inclusive os meus", disse. 

Além de sua própria postura catastrofista, Lovelock acusa também o ex-vice-presidente norte-americano Al Gore e seu filme Uma Verdade Inconveniente como exemplo do alarmismo ambientalista.

"O clima continua fazendo os seus truques de sempre. Não tem nada de muito emocionante acontecendo agora. Deveríamos estar a meio caminho de fritarmos", mas não é isso que está acontecendo, disse. Ele estranha o fato de que a temperatura global da Terra não tenha aumentado nos últimos 12 anos, embora os níveis de gás carbônico (ou dióxido de carbono) na atmosfera, demonizado como o principal gás do efeito estufa, continuem subindo e batendo recordes. O aquecimento previsto para os 12 anos seguintes a 2000 não ocorreu. "Doze anos é um tempo razoável”, e a temperatura tem permanecido constante. 

Embora sem abrir mão da tese de que as emissões humanas de dióxido de carbono possam levar a um aumento global na temperatura, ele concorda agora que faltaram estudos a respeito do efeito dos oceanos sobre o clima. O oceano pode ter um papel fundamental, admite. "Ele poderia fazer toda a diferença entre uma idade quente e uma idade do gelo", disse. 

Há uma pergunta no ar: foi um erro? Lovelock foi um dos principais formuladores do ambientalismo como ideologia, baseado num “santuarismo” paralisante do desenvolvimento particularmente de países pobres, entre eles a China, a Índia e o Brasil. Entre a ciência e a política, sua ação abandonou a primeira para reforçar o conservadorismo capitalista dominante e a defesa da manutenção da distribuição do poder político e econômico no mundo a favor das potências industriais capitalistas. 

Ele foi um dos principais esteios da condenação dos cientistas que não aceitavam a tese dos adeptos da corrente principal do pensamento ambiental segundo a qual a mudança climática seria resultado da ação humana. E que tentaram desqualificar esses críticos impondo-lhes o rótulo de “céticos”. 

O rolo compressor de um autointitulado “consenso científico” simplesmente desconsiderou as críticas científicas solidamente fundamentadas que recusavam as “verdades” dogmáticas deste verdadeiro evangelho do santuarismo ambientalista que é o relatório do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o organismo da ONU dedicado ao problema) onde os questionamentos feitos pelos cientistas foram simplesmente ignorados. Lovelock foi um dos pilotos desse rolo compressor do conservadorismo ambientalista. 

Neste sentido, falar em “erro” pode ser simplório pois, na verdade, tratava-se de um dogma político que precisava ser impingido a países que defendiam seu direito ao desenvolvimento combinado com a defesa do meio ambiente. No mundo posterior à crise econômica de 2007/2008 e do rearranjo do quadro geopolítico internacional que veio na esteira dela, os dogmas do rolo compressor do aquecimento global simplesmente perderam o sentido e não colam mais. Qual será, agora, o próximo erro?

Eduardo Bomfim: Uma rara oportunidade

Reproduzo artigo do camarada Eduardo Bomfim:
Manifestação de trabalhadores em Portugal

O primeiro de maio no mundo mostrou, pelas gigantescas manifestações acontecidas, a extensão e profundidade da crise do projeto neoliberal ortodoxo em vigência por quase todo o planeta, expõe os gargalos de natureza estrutural tanto do próprio sistema quanto desse modelo econômico imposto às sociedades pelo menos nos últimos vinte e cinco anos.

Um período caracterizado pela hegemonia absoluta do neoliberalismo que alcançou uma abrangência multilateral permeando os espaços da economia mas se estendeu também aos campos da cultura, comunicação, diplomacia, política, além do inquestionável predomínio militar.

Uma época em que foram mutilados vários princípios fundamentais da Carta das Nações Unidas, elaborada após a vitória dos aliados contra o nazi-fascismo.

E tem sido tamanha a força política, militar, do capital financeiro internacional e dos Estados Unidos, guardiões da nova ordem mundial, que essa Carta foi reescrita na prática, adequando-a aos novos movimentos de expansão, centralização do capital em nível global.

Produziu-se também um discurso teórico, ideológico cujo objetivo central tem sido a manutenção da supremacia absoluta das estratégias políticas e financeiras do capital, implementadas através dos organismos que compõem a nova ordem mundial onde o complexo midiático internacional hegemônico exerce papel determinante.

Esse centro de poder mundial, fenômeno que surgiu após a débâcle da URSS, sustentado militarmente, elaborou uma "nova agenda social" como falsa e fragmentada alternativa às fundamentais plataformas universais das lutas dos trabalhadores e nações, partindo da problematização de temas pertinentes e generosos, mas que passaram a ser ditados como a quinta-essência da chamada "questão social".

Mas as consequências da atual crise sistêmica do capital repõem na ordem do dia, de maneira objetiva, as principais bandeiras de lutas relativas à emancipação dos povos, assim como o combate pela soberania nacional, como elementos incontornáveis ao progresso social de qualquer País.

O Brasil na contramão da crise global precisa adotar estratégias com vistas à construção de um projeto de nação (e de civilização) alternativos a esses impostos pela nova ordem mundial que se encontra visivelmente esgotada. Em um mundo que se encaminha para uma transição histórica, é uma rara oportunidade que não pode ser desperdiçada.

* Advogado, membro do Comitê Central do PCdoB
quarta-feira, 2 de maio de 2012

PCdoB lança documento sobre política ambiental



Em reunião realizada em meados do mês de abril, a Comissão Política Nacional do PCdoB debateu a redação de um documento oficial sobre a política ambiental do partido. Para a direção nacional da legenda, a incorporação da questão ambiental no Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento é fator estruturante para a promoção de um salto civilizacional no país.

A formulação da política ambiental do PCdoB é baseada na teoria marxista e a análise da realidade concreta do meio ambiente. Situando que a degradação ambiental ocorre há muito tempo, o documento afirma que “o capitalismo transforma tudo em mercadoria e, em sua fase imperialista, exacerba a privatização dos recursos naturais e procura controlar as fontes destes recursos nos países em desenvolvimento”.

A resolução defende ainda a valorização da natureza e do meio ambiente, considerando o ser humano parte da natureza — conforme aborda Marx nos Manuscritos Econômicos e Filosóficos de 1844. “O homem vive da natureza, isto é, a natureza é seu corpo, e tem que manter com ela um diálogo ininterrupto se não quiser morrer. Dizer que a vida física e mental do homem está ligada à natureza significa simplesmente que a natureza está ligada a si mesma, porque o homem dela é parte”.

O partido considera ainda que a solução de fundo para a crise econômica, social e ambiental do capitalismo só virá com a adoção de um sistema de produção e consumo voltado para o bem-estar da humanidade, o socialismo.


Clique no link para ter acesso ao documento: DesenvolvimentoSustentável Soberano

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Ex-diretor da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) e ex-presidente da União da Juventude Socialista (UJS) de Alagoas. Atual militante e presidente do Comitê Municipal de Maceió do Partido Comunista do Brasil, PCdoB.
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